30 dezembro 2005

Atenção que se vai falar bem do país!


Este foi um tema que me levou a discuções acesas com alguns colegas e amigos, é um tema que eu adoro discutir. Levou-me a sentimentos controversos na época de decidir se preferia Espanha ou Portugal, e continuo a debater-me porque considero que o pior é que somos tão negros de visões que nos afundamos a nós própios, como país, quero dizer.

Como a maioria dos que aqui passa sabe, eu acabei por não ter mais opção em ir estudar para o país vizinho, ainda que hoje (e já na época) considerasse que essa era a melhor idéia; Portugal não nos acena com grandes oportunidades de futuro e o "estrangeiro" continua a dar-nos sempre, ao que consta, melhor formação e/ou abrir mais portas do que o nosso terreno.
Não obstante, e contra tudo o que se possa pensar, eu tenho uma paixão quase cega pelas paisagens onde cresci! Não somos muitos e eu tenho a honra de ser uma das portuguesas!
Isso não calha a qualquer um!! De maneira que, para meu orgulho, não tenho problemas em mostrar o quão sofro de saudades, não só de familia e amigos mas também de tudo o que é puramente luso!!(é verdade, confesso.. tenho andado a tentar descobrir o maldito 560 em todos os códigos de barras;o)).

Para minha alegria ainda, gostava de vos contar uma das aventuras que me aconteceu mesmo quando regressava ao meu lugar:


A viagem que o meu pai me marcou, por pura despistagem, foi marcada para uma hora (que não vou referir para não chocar os mais sensíveis)que não combina com as pessoas de bom tom como eu;o) de forma que era absurdo, a meu ver, estar a pedir às minhas lindas freiras da residência que acordassem duas horas antes da minha partida e irem abrir-me os portões de propósito. Ora bem, partindo disto, decidi que, havia de ir directamente dormir umas horitas ao aeroporto juntamente com a minha distinta tralha!!
Nenhuma idéia teria sido tão genial, principalmente para quem ainda não tinha feito a mala toda e, portanto, desconhecia por completo o real peso que ia carregar!!
Para melhorar qualquer noite de despedida decidi ainda combinar com os colegas do catalão um belo jantar, que se prolongaria até ao limite do último horário de comboio para o meu destino final e assim foi...Calha que eu também contava deixar, entretanto, a mala na casa de um amigo e este senhor desapareu, oportunamente.. mas adiante!!
Indo nós jantar ao, penso eu, único restaurante que tem escadas de Barcelona, com mala e tudo, consegui levar a cabo a missão esta de passar bem com eles antes de partir (ainda que houvesse uma série de histórias fantasmagóricas pelo meio.. mas adiante!!).
Cheguei finalmente a Sants onde apanharia o autocarro (Barcelona está em obras...)e mesmo quanto ia a entrar no dito cujo-já amaldiçoara vezes sem conta a lei da gravidade e o sr Einstein- tropecei e quase malho para cima de uma mocinha inocente que, graças a Deus, compreendeu a minha situação e começou alegremente a falar comigo em inglês. Esta rapariga, mais voluntariosa ainda, ajudou-me naquele momento difícil de subir o raio dos degraus da carrinha e pôs-se logo a tagarelar a dizer que entendia muito bem aquela situação porque havia cinco meses que não lhe acontecia outra coisa...
Explicando melhor, a Rachel estava já a contar-me que também estava a dirigir-se para o aeroporto, onde ia dormir, para seguir depois num voo para California!!
Comecei por contar um pouco das minhas peripécias daquele dia e, achando curiosa a primeira frase dela fui-lhe perguntando que raios fazia ela, há cinco meses, assim. Esclareceu-me dizendo que estava a fazer uma viagem sozinha por toda a Europa; nestes cinco últimos meses andara com as suas trouxinhas que acumulavam recordações de vários lugares, para baixo e para cima...
Tinha conhecido muitos: Itália, Polónia, França, Bélgica,Espanha, Alemanha, Austria, Portugal...
Perguntei-lhe, sem demorar muito, qual deles ela tinha gostado mais, quais os que mais a marcavam...
Sim, Para meu espanto começou por lembrar os Italianos... Mas a seguir.. e com um tom bastante convincente, falou-me de um país alí ao lado de Espanha, seguramente eu nunca o havia visitado mas valia muito a pena!!!- Portugal!!-.

- Oh.. a sério?? Gostaste?

- Adorei!! Nem imaginas a hospitalidade das pessoas. Se me permites ser franca, gostei muito mais de Portugal do que de Espanha. Não me leves a mal...
É que as pessoas são tão diferentes! O atendimento, o cuidado, a atenção...
E é que é tudo tão típico, tão diferente de tudo. A beleza que reveste aquelas serras, os parques...
Txxiii... e a comida?? MEU DEUS!!! Aquele queijo!!! Jesus!! O vinho!!

A moça partira do pressuposto, e depois de me ter visto a indicar umas coisas a umas espanholas em castelhano, que eu era uma autoctone!
A menina mostrava-se apaixonada e nem sabia ela a prenda que me estava a dar naquele dia em que eu tinha as saudades esticadas ao máximo da minha capacidade...
Continuei calada...
Ela falava-me da música deles... o fado.. era algo que não se ensinava sabias?? e saía dos corações melancólicos deles!!! Comprara tantas coisas portuguesas para levar de recordação!! Aliás, pretendia voltar ao país quando pudesse e mostrar tudo aquilo á familia...
Eu só ouvia!
Os italianos também eram muito engraçados, tinham uma comida muito boa também.. Mas primavam pela graciosidade... pecavam por ter cidades sujas...
No fim de tudo aquilo, estavamos já a chegar ao aeroporto ela reparara no meu silencio. Entendera que exagerara!Havia dito a uma espanhola que Portugal era bem melhor, quer na hospitalidade quer na beleza!!
Eu simplesmente estava admirada...
Depois de pararmos e decidirmos que iamos para a mesma terminal para dormirmos ou conversarmos juntas até a hora do avião, notei que estava constrangida, e também tentava falar bem de Espanha, sem grande sucesso... Falava na arte de Barcelona, na beleza de alguns sitios pelos que passara...
Eu contei-lhe, por fim, que estava ali para ir para casa também, que tinha um voo marcado para deshoras, que ia para o meu país depois de ter estado uns tempos fora para estudar...
Contei-lhe que ia para Portugal!
Ficou boquiaberta!!!
Sorriu e explicou-me que estava a ficar embarassada mas que, agora sinceramente, detestara Barcelona!! Que era fria, que não entendiam nem espanhol nem ingles, que não vira qualquer tipo de boas-vindas por parte dos Espanhois em parte alguma...Inclusivamente, pela primeira vez estava amedrontada por passar ali aquela noite...
Foi giro... Falamos o tempo todo (ou não fossemos nós mulheres) apercebi-me de quantas semelhanças temos os humanos... Das saudades que guardamos ainda que muitos não tenham uma palavra para o descrever por inteiro...
Senti-me sortuda por conhecer mais alguém que gostava de nós!
Espero que agora entendam a minha posição e remarcada afirmação para com o meu país...
Levei algumas bofetadas dele, erros que só quando compreender a dimensão das coisas, só quando tiver preparação, poderei mudar e fazer subir este meu chão no qual acredito.
E eis a minha história...***






23 dezembro 2005

De volta à carga!!

Enfim penso poder escrever algo, depois de tanto tempo e de tantas coisas novas!!

Só agora tive tempo para respirar, a universidade têm-me sugado o tempo de uma forma que eu nunca julguei possível, mas não me queixo, uma vez que têm sido bom aprender "coisas de médicos";), eu sinto-me feliz com isso, ainda que nunca deixe de ser demasiado cansativo.

Ara mateix, como dizem os colegas lá da catalunha (expressão que não quer dizer mais que " agora mesmo";o)), Estou em período de descanço, finalmente!

Não é que tenha coisas muito inovadoras para contar; escrever às vezes serve-me só para aliviar a vontade que tenho de construir coisas e não sei bem como, mas assim também aproveito para partilhar aqui no blog, com quem passa, das minhas novas aventuras lá com a medicina e com o catalão, a nova língua.

Espanha inteiro, e agora o vejo mais claramente, tem qualquer coisa contra os de Barcelona e a verdade é que os catalães não são nada disso que eu tinha ouvido falar, até bem pelo contrário, têm-se mostrado bastante acolhedores e posso já contar com alguns amigos por lá, felizmente.

Isto de se ir para tão longe, mudar de vida, costumes e cultura, têm os seus quês e cada vez me convenço mais de que se têm tratado sempre de mais valias para mim; a cada dia sei de uma nova coisa, não só da zona onde habito como também de todo o mundo, porque, por exemplo na aula de catalão, tenho colegas de todos os cantos e esquinas deste imenso mundo: uma de S salvador, uma mexicana, um colombiano, um belga, um bulgaro, uma polaca, uma italiana (alguns aqui em baixo;))... assim e dado que o programa de ensinamento catalão também favorece estas coisas acabamos por conhecer de tudo um pouco...
Da faculadade de medicina também não me queixo, bem pelo contrário, conseguimos juntar o útil ao agradavel. Somos imensos portugueses (cerca de 15 num grupo de 300- o que é bastante)facto que nos permite ter sempre alguém que entenda por inteiro (digamos que falar na nossa língua natal tem bem mais que palavras e só quem a fala também nos entende lá do fundo...) e por outro lado temos imensos catalães e espanhois ( a distinção foi feita por respeito a esses que agora se tornam amigos e que me explicam que isso é um sentimento...;o)). Assim aprendemos a língua e cultura, mais a medicina e a amizade com eles.

As prácticas têm sido, mais que tudo, motivadoras e as oportunidades já nos têm surgido nesta universidade que agora defendo como minha, porqua assim o é. Há projectos e idéias a ser debatidas com bastante afinco e profissionalidade, já desde o primeiro ano. Além disso, há os dias de CAP (centro de atensió primária) onde nós ainda não podemos olhar as pessoas com olhos de médicos mas já podemos assistir ao médico nas coisas mais triviais sentindo-nos mais animados e motivados para o que se segue...Além disso, estes dias em que nos vestimos de bata branca e adentramos o consultório do médico orientador, tomamos conhecimonento da forma de interacção entre equipas, do funcionamento da papelada, do tratamento de bastidores que reveste esta vida médica de uma variedade enorme de coisas que não nos passam pela cabeça que existam. Dão idéia de alguns falhos dificeis de contornar que todos os dias são pontos que preocupam as equipas, falhos que temos que estar preparados para assitir... Ali sentimos os quão variados devemos ser todos nós para salvaguardar o nosso objectivo: o cuidado, assistência e atensão dos pacientes!

Assim me voam estes dias em que as saudades dos nossos se multiplicam em exponenciais, em que o cansaço nos come a cabeça e nos anestesia, um sono tranquilo para um novo dia...
Nesta roda viva começam a surgir amigos que só confiamos, sem mais explicações profundas porque as não há... Aparecem claros aos nossos olhos fraquezas que até ali não acreditavamos ter e que nos tornam os humanos que somos.
Começa a parecer-nos certo que em algum momento temos limite... E no dia seguinte lá estão mais pessoas e mais frases que nos tocam, mais gente, mais coisas para saber e, estranhamente gostas...

Chegar a casa, sozinha, é de alguma forma, muito bom. Passear e ver tanta gente diferente, linguas que não entendo ou talvez algum portugues misturado, aspectos e feições...
De manhã chega a ser mais custoso.
Uma vez passei por um corpo a tremer. Chamo-lhe assim porque efectivamente estava embrulado, dormia naquela
curva que eu faço para apanhar os ferrocarrís, e estava naquele saco-cama vermelho, deitado no chão, tremia tanto que não fui capaz de destinguir se era um corpo feminino ou masculino... Sei só que aquela imagem vai ficar gravada por algum tempo.
Bem se diz que tudo tem o seu reveros e é assim que Barcelona mostra o seu avesso...No entanto, apesar de tudo e talvez até de forma egoista, eu gosto de lá estar. Sinto-me sortuda e vou continuar a aproveitar esta oportunidade que me calhou viver.
Amanha quem sabe?